segunda-feira, 27 de agosto de 2012

O regicídio de Luís XVI.


O regicídio revolucionário não se reduz à exclusiva morte de um homem, mas ataca também a família, a família real, e, através deles, um regime, a monarquia de direito divino, um tipo de sociedade, a França Católica e monárquica do século XVIII, uma civilização, a civilização cristã de estilo Constantino e, em última análise, um princípio, a realeza sacerdotal de Cristo como pedra angular do edifício social e religioso do Ancien Régime

... Donde procede, pois o regicídio? É necessário notar que a dinâmica não poderá reduzir-se a causas puramente materiais, socio-lógicas ou económicas. De facto, as condição de vida na França de 1789 são melhores que no passado, e quase idênticas às dos franceses sob a Restauração. Se aqui e acolá há crises e fome, elas por si sós não podem motivar mais do que revoltas, mas não revoluções - de tal modo o regime nessa época é sentido como legítimo. 

Conclui-se daí que é necessária uma dimensão espiritual e ideológica para catalizar o descontentamento e as ambições insatisfeitas e empurrar para uma mudança de regime e de civilização que, à partida não é desejada por ninguém. Pode-se assim opor, como o fizeram numerosos autores por exemplo Michelet, o espírito da Revolução ao espírito do Cristianismo, que se combatem numa nova guerra de religião - o espírito da Revolução, mantendo-se apesar das aparências tão religioso quanto o espírito do Cristianismo.. 

Neste contexto, a morte de Luís XVI já não aparece como um acontecimento histórico isolado, mas como um fenómeno emblemático da oposição de dois espíritos: um homem encarnando um determinado princípio é condenado e morto a fim de que este princípio não possa mais influenciar o desenrolar das questões humanas. É este princípio que importa agora descrever.

Na teologia política cristã tradicional, datando da época de constantiniana, qualquer soberania e qualquer legitimidade política vêm de Deus, e mais precisamente de Jesus Cristo, ao mesmo tempo rei e sacerdote, rei enquanto representando o seu povo junto do Pai, e sacerdote enquanto ofertando ao Pai o sei sacrifício perfeito, porque divino, em reparação dos pecados da humanidade decaída. Ora, os cristãos, pelo sacramento do baptismo, graças ao qual eles se «revestem» de Cristo (Gal 3,29), participam assim da realeza sacerdotal de Cristo; passa-se o mesmo, de maneira plena, com os sacerdotes e os bispos, por efeito de um sacramento especial, mas também com o reis e, muito particularmente, com o rei de França, que beneficiava, desde a sagração de Clóvis em Reims, de um unção que lembrava a dos antigos reis de Israel e fazia da França a filha primogénita da Igreja. Esta função fazia o rei o representante de Cristo sobre a Terra, pelo menos no que concernia aos assuntos temporais. Nesta qualidade, o rei era teoricamente independente em relação às leis, em virtude da máxima de Ulpiano: princeps legibus solutus est; mas mantinha-se ao mesmo tempo ligado às leis e aos costumes do reino, que a tradição jurídica designava por «constituição francesa», assim como à lei natural. A contradição era geralmente resolvida lembrando o exemplo de submissão voluntária de Cristo à lei, e fazendo do rei (ou do imperador) uma «lei viva» (lex animata). Além disso a monarquia francesa tinha igualmente a obrigação de respeitar costumes e privilégios..

Fazendo eco à cristologia Paulina, onde Cristo é o esposo e a cabeça da Igreja, a teologia e o direito consideravam o rei como o esposo da nação, o marido da República, já que esta era tradicionalmente simbolizada por uma figura feminina. Esta relação esponsal, concebida juridicamente como um contrato sinalagmático, impunha ao rei e à nação um determinado número de obrigações. De um modo mais geral, a relação entre o rei e os seus vassalos era concebida sobre um modelo familiar que o próprio Luís XVI reclamava para si mesmo, afirmando que «tudo o que o pai deve ao seus filhos, o irmão aos seus irmãos, o amigo ao seu amigo, o príncipe deve-o aos seus vassalos»; ou ainda: «o Rei, o pastor, o pai, é uma só e mesma coisa.» O rei devia-se aos seus vassalos e os vassalos deviam-se ao rei. Luís XVI escrevi assim: 

«Como nada os [meus povos] pode dispensar, quando eu for injusto ou tirano, de me serem submissos, se por seu lado todos eles violassem os seus deveres para comigo, nada me poderia subtrair à obrigação de cumprir os meus para com eles». Para o rei, isso podia ir precisamente até ao sacríficio.

 Assim, como escreveu um jurista da Idade Média, Aeneas Silvius:«O próprio príncipe, cabeça do corpo místico da respublica, é obrigado a sacrificar a sua vida cada vez que o bem comum o exige.» Do mesmo modo, Luís XVI, ás delegações dos guardas nacionais, em 13 de Julho de 1790, falando dos franceses:«Dizei-lhes que, se não posso deslocar-me convosco aos seus asilos, quero aí estar pela minha afeição e pelas leis protectoras do fraco velar por eles, viver para eles, morrer, se for preciso, por eles.» Luís XVI era, aliás dotado de um carácter profundamente bom, que infelizmente foi assemelhado à fraqueza; esse carácter tinha chamado especialmente a atenção de Benjamin Franklin quando conviveu com ele: «nenhum soberano que algum dia reinou teve, inegavelmente, mais bondade no seu coração nem possuiu em maior grau o leite da ternura humana que Luís XVI.» Esta qualidade parece de resto ter sido o apanágio da sua linhagem, pois lemos numa carta de John Adams a Thomas Jefferson em 1814: «O leite da ternura humana dos Bourbons confere mais segurança à humanidade do que a ambição desmedida de Napoleão.»

De uma maneira geral, o rei de França era a pedra angular de toda a ordem jurídica e social; era também obrigado, pela sua sagração, a ser o protector da Igreja. neste contexto, o regicídio - no sentido da destruição do princípio real - visava destruir o ele entre o rei e a república, e, por conseguinte entre Cristo - ou Igreja - e a França e, consequentemente, destruir toda uma civilização que a pouco e pouco desabrochara e se tinha expandido na Europa ocidental, até mesmo o próprio cristianismo. É, evidentemente, ao espírito da Revolução que se deve imputar o regicídio- Este espírito consiste numa visão do mundo profundamente secularizada, colocando como fundamento da soberania a natureza, em vez de uma divindade revelada. Ele inclui as Luzes newtonianas, mistura curiosa de cientismo e de esoterismo que se encontra na franco-maçonaria, as luzes francesas, que não são senão uma adaptação superficial destas últimas ao grande público francês, enxertando-as no jusnaturalismo descristianizado da oposição parlamentar da oposição parlamentar, prevalecente à época nos meios intelectuais.



domingo, 26 de agosto de 2012

O ódio anticatólico do Partido Democrata dos Estados Unidos.



O Arcebispo de Nova York, Cardeal Timothy Dolan, foi convidado pelo partido republicano para oferecer uma bênção pelo encerramento da convenção geral que oficializará a candidatura de Mitt Romney como presidente dos Estados Unidos. A notícia foi divulgada por Romney durante uma entrevista ao principal apresentador da rede católica norte-americana EWTN.
Mitt Romney escolheu como parceiro de chapa o jovem deputado Paul  Ryan, um católico que procura seguir a doutrina social da Igreja na abordagem econômica e na sua postura pró-vida.
A bênção do cardeal não será um endosso pessoal ou da Igreja Católica – Timothy Dolan é presidente da Conferência de Bispos dos EUA – mas terá um peso significativo, uma vez que a arquidiocese de Nova York é uma das 40 organizações católicas que estão processando o governo Obama pela imposição do seu plano de saúde que obriga empregadores – incluindo a Igreja – a fornecer planos de saúde com serviços de esterilização, contraceptivos e abortivos.
Para Dolan e a maioria esmagadora dos bispos americanos esse plano de saúde é uma afronta às consciências e à liberdade religiosa.
Em declaração à imprensa, o porta-voz da arquidiocese afirmou que “ficou claro para os organizadores de convenções, no entanto, que o cardeal estava vindo apenas para rezar e não para endossar, e que ele estaria disposto a aceitar uma oferta semelhante da parte do Partido Democrata”. O Partido Democrata, seguindo ordens do Presidente Obama, dispensou o convite.
Patrick Archbold, do periódico National Catholic Register, afirma que a decisão pessoal do Presidente Obama em não aceitar a bênção do cardeal é pragmática e estratégica. Embora Obama participe de um jantar beneficente católico oferecido tradicionalmente pela arquidiocese de Nova York aos dois candidatos presidenciais, ele não se arriscaria a ter na Convenção Democrata, que “deverá ser um festival dos amantes do aborto”, segundo Archbold, um discurso pelo respeito da vida e do nascituro. Segundo Archbold, Obama sabe que durante o jantar o cardeal não se atreveria a criticá-lo publicamente.
Até o momento o legado do presidente Obama é uma economia em estado vegetativo, um forte apoio à redefinição do matrimonio e ao casamento gay –primeiro presidente a endossar publicamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo – e um atentado violento à liberdade religiosa. Contudo, a probabilidade da sua reeleição é alta, uma vez que os católicos latinos, que formam uma porção substancial de votos, estão alinhados com Obama. Os americanos católicos e evangélicos estão inclinados na direção de Romney.















sábado, 25 de agosto de 2012

Por que a esquerda odeia Pelé?


Sábado agora, 23 de outubro, Pelé completou 70 anos. É uma vida que se faz eterna, e extraordinária, num cenário de dimensão planetária.
Há uns dez anos Nelson Mandela, insuspeito líder sul-africano, criou o Prêmio Pelé, destinado a personalidades que contribuam para a harmonia entre os povos do continente africano. Na década de 1980, um Comitê Internacional de Esportes, reunido em Paris pela revista "L'Equipe", o elegeu Atleta do Século. No início do ano 2000, o New York Times apontou-o como uma das personalidades do século XX. Antes, a Rainha da Inglaterra já havia concedido ao rei do futebol o título de Sir, honraria só facultada aos britânicos. Isso sem falar de pesquisa da Agência Ogilvy que apontou a Coca-Cola, o Papa e Pelé como os três primeiros nomes imediatamente reconhecidos em todo mundo.
Pelé! - Desde o fim dos anos 50 a imagem do atleta perfeito (e do homem singular) é acompanhada por sucessivas gerações, nos mais longínquos rincões da terra.
Nesse colossal testemunho coletivo, o mundo se transforma e Pelé - com seu sorriso, elegância e otimismo - fica.
E fica como um referencial de vitalidade que se identifica com a eternidade. Sim, porque ao lado de ser um fenômeno esportivo, ele é aceito como um prodígio ontológico, na medida em que representa o melhor latente em todos e cada um dos mortais. Assumido como ícone, ele tornou-se para os contemporâneos, com suas conquistas - tal qual Apolo ou Dionísio para os gregos -, uma divindade venerada em todo mundo.
Em todo mundo, menos no Brasil. Aqui, a despeito de feitos e glórias, Pelé, para uma minoria que se autoproclama "progressista", não passa de um negro rico, "de direita", vendido aos americanos - e que mete as ventas onde não é chamado. Quando, por exemplo, ao fazer o milésimo gol de sua carreira no Maracanã dedicou a conquista às crianças desamparadas do Brasil, e para elas pediu atenção, foi logo considerado pela minoria recalcitrante como um demagogo vulgar, um "tirador de média".
Talvez não fosse apropriado dizer que há um preconceito da esquerdalha contra Pelé por ser ele um negro rico (não tanto quanto merece), pois o jargão no Brasil é de que o preconceito é contra o pobre. Por outro lado, a má vontade contra Pelé parte justamente de um tipo de gente que se diz empenhada na ascensão da pobreza, constituída, em sua maioria, pelos negros.
Fosse ele um fanático defensor de Fidel Castro ou solidário à visão da história como uma eterna luta de classes, é provável que ele hoje estivesse consagrado no panteão do "divino maravilhoso". Mas como é democrata, acredita em Deus e admite a propriedade privada, é visto pela esquerdalha como um estorvo.
Mas é preciso enfatizar que o ser humano Pelé, antes de tudo, é o cidadão religioso, o amigo generoso, o talento que compõe e interpreta, o filho atencioso, o pai solidário, o homem elegante e gentil, o eterno viajante de todas as horas a levantar a bandeira da paz e da harmonia entre homens e povos - independente de credo, cor ou condição social.
Ademais, sem fazer alarde, quase omitindo o feito fora do âmbito familiar ou do restrito ambiente profissional, Pelé luta a seu modo e de forma concreta pela decantada "inclusão social", mantendo creches e escolas para crianças abandonadas com dinheiro do próprio bolso - uma atitude impossível de se ver entre a espumosa gente do nosso "beautiful peoble" ou do festivo (e milionário) "showbizz" tupiniquim.
Pelé, óbvio, como todo ser humano, tem virtudes e defeitos. Aos que o detratam, no plano esportivo, responde: "Para ser Pelé, é preciso fazer 1.283 goals, ganhar três copas do mundo, duas vezes o mundial de clubes, dezenas de campeonatos estaduais e uma centena de competições nacionais e internacionais". Aos que o atacam como indivíduo ele apenas cala.
Quando a mim, por força de filme que fizemos juntos, "Pedro Mico", pude testemunhar, na refrega cotidiana do set de filmagens, toda sua humilde grandeza de ser humano distinto, talentoso e disciplinado. Foram dois meses de inspirada colaboração, inesquecíveis, inclusive para Pelé - segundo garante ele até hoje em livros, depoimentos e entrevistas.
Bem, eis o que eu queria dizer: mais do que simples ator, Pelé é um ser convergente dotado do melhor da capacidade humana. Ao contrário de tipos como Lula, por exemplo, ele tudo vê, tudo ouve e tudo compreende - afetiva e criticamente - razão de ser de sua Majestade Universal.
Vida longa ao Rei Pelé!



São Luís Rei de França e seu combate ao Talmude


A cruzada começou em 1236 quando Nicholas Donin, um judeu apóstata, tornou-se cristão e dominicano. Donin pediu uma audiência com o Papa Gregório IX. Ao recebê-lo, Donin chamou a atenção do papa para as blasfêmias na coleção de escritos hebraicos conhecida como Talmud. As sinceras opiniões de Donin causaram sua expulsão da sinagoga 11 anos mais cedo. Assim, a vingança pode ter sido um motivo, mas Donin tinha consigo uma aguda compreensão do papel do Talmud na vida Judaica. Era, como Graetz alegava, “o suporte principal da civilização Judaica”; era também cheio de blasfêmias – alegando, entre outras coisas, que Cristo estava sendo cozido em excrementos ferventes no inferno e que era o filho ilegítimo de um soldado romano e uma prostituta chamada Maria.

A Enciclopédia Judaica, por exemplo, discutindo a dívida de Celso ao Judaísmo, observa que “ele afirma que Jesus era o filho ilegítimo de um certo Panthera, e novamente que ele havia sido um criado no Egito, não enquanto criança conforme o Novo Testamento, mas quando ele já era crescido, e que havia aprendida a arte secreta. Esses relatos são freqüentemente idênticos àqueles do Talmud.” De acordo com uma outra fonte, os Judeus “chamam Cristo o filho ilegítimo de uma prostituta, e a Santíssima Virgem Maria, uma coisa abominável dizer ou pensar, uma mulher fogosa ou luxuriosa, e que eles os amaldiçoam conjuntamente, e a fé Romana, e todos seus membros e crentes.”

Antes de Donin, o Talmud era virtualmente desconhecido entre os Cristãos, que, como o Papa Gregório IX, laboravam sob a ilusão que os Judeus meramente seguiam a Torah, livros que os Católicos também consideravam canônicos. Como resultado dessas descobertas, “o Talmud repentinamente se tornou o alvo principal do anti-Judaísmo Cristão.” A campanha contra o Talmud é o início da mudança na atitude da Igreja em direção aos Judeus. Sicut Judaeis non nunca mudou desde o tempo de São Gregório o Grande até o tempo dos Mendicantes. O que mudou foi a compreensão da Igreja dos Judeus. Eles foram, nos olhos da Igreja, transformados de essencialmente cegos seguidores de uma compreensão perversa da Torah em revolucionários sociais grandemente como resultado da descoberta do Talmud e suas blasfêmias.

Gregório IX foi o primeiro papa a descobrir o Talmud. Ele ficou chocado pelo que descobriu, mas não ab-rogou Sicut Judaeis non e sua proibição de não prejudicar os Judeus. O mudou foi sua compreensão do que os Judeus acreditavam e como eles agiam sob aquelas crenças.

Em 9 de junho de 1239, o Papa Gregório respondeu às 35 petições de Donin, despachando-lhe uma carta ao bispo de Paris, William de Auvergne. Os Judeus, escreveu Gregório, “assim escutamos, não estão satisfeitos com a Lei Antiga que Deus deu a Moisés na escrita: eles até ignoram-na completamente e afirmam que Deus deu-lhes uma outra Lei que é chamada ‘Talmud’, isto é, ‘Ensinamento’, passado de geração em geração oralmente para Moisés... Nisto está contido assuntos tão abusivos e tão impronunciáveis que estimulam a vergonha naqueles que mencionam-nos e horror naqueles que escutam-nos.” As ofensas são tão grandes que Gregório usa a palavra “crime” para descrevê-las.

Angustiado com o prejuízo que ele criava, São Luis IX, Rei da França, convocou uma conferência sobre o Talmud. Em junho de 1240, Nicholas Donin teve um prolongado debate com o Rabino Yehiel bem Joseph de Paris, sob os auspícios reais e presidido pela Rainha-Mãe, Blanche de Castile.

Com defensores com o Rabino Yehiel, o Talmud não precisava de inimigos. O debate resultou na queima pública do Talmud in Paris. A religião Judaica era agora claramente vista não como Judaísmo bíblico, mas particularmente como um desvio herético do Antigo Testamento. Por um período de 36 horas em junho de 1242, mais de 10.000 volumes foram atirados às chamas. Como se determinava provar o que os Cristãos haviam dito era correto, um grupo de Judeus apelou a Roma, “reclamando que eles não podiam praticar sua religião sem o Talmud”. “Mais uma vez”, escreve um comentarista Judeu, “foi o papa a quem os Judeus viraram-se em sua situação difícil”. Em maio de 1244, Inocêncio IV apiedou-se: “obrigado como nós somos pelo mandamento divino a tolerá-los em sua Lei, pensamos ser adequado dar-lhes como resposta que não queremos privá-los de seus livros se como resultado devêssemos estar-lhes privando de sua lei.” A decisão de retornar o Talmud aos judeus causou escândalo. Um bispo concluiu que os Judeus haviam mentido ao papa, e seria “mais desgraçado e uma causa de vergonha para o Trono Apostólico se os livros que haviam sido tão solenemente e tão justamente queimados na presença de todos os estudiosos e do clero, e da populaça de Paris fossem devolvidos aos mestres dos Judeus na ordem do papa – pois tal tolerância pareceria aprovação.” Em 1254, Luís IX renovou a lei ordenando a queima do Talmud, como fizeram seus sucessores. Quando Luís X readmitiu os Judeus na França, ele barrou-os de trazer consigo o Talmud.

Uma vez que o Judaísmo cessou de ser a religião do Antigo Testamento na mente da Igreja, ficou interpretado em seu lugar como uma heresia que inclui-se na jurisdição de guarda doutrinária da Igreja. O Talmud era uma ofensa não somente contra os Cristãos, mas contra a vida religiosa dos Judeus também, que permitia ao papa intervir em seus assuntos “se violassem a lei do Evangelho em matéria moral e seus próprios prelados não os detivessem” ou “se eles inventassem heresias contra sua própria lei.” “A linha de pensamento de Inocêncio rapidamente se tornou a opinião comum dos canonistas do século XIII e XIV.” A Igreja, de acordo com o inquisidor Dominicano Nicholas Eymeric, agora tinha o direito e dever de “defender o Judaísmo genuíno contra a heresia interna e, através disso, trazer os Judeus mais perto de uma aceitação do Cristianismo.”

Os Judeus eram heréticos de sua própria religião, e na medida em que a Torah era parte do cânone da Escritura Cristã, eles eram heréticos no sentido Cristão, igualmente. Na medida em que heresia não era uma matéria de indiferença às autoridades civis, os Judeus Talmúdicos perderam a tolerância que as figuras cega e carnal do Antigo Testamento experimentavam e se tornaram personae extra legem, isto é, foras-da-lei.

A descoberta do Talmud mudou a questão Judaica fundamentalmente. O que costumava ser uma questão de tolerância religiosa se tornou um assunto de ordem civil. O rei Cristão podia tolerar intrusos que baseavam sua religião em uma defeituosa, porém sincera compreensão do Antigo Testamento; ele não poderia tolerar foras-da-lei e subversivos usando a religião como máscara para a revolução social. Os Judeus foram categorizados como criminosos; como pessoas que promoviam “violência ilegal”. Eles eram, diz Cohen, “não mais Judeus da Bíblia, a quem o direito de existência na Cristandade havia sido garantido.”

Em 1267, Clemente IV publicou a bula Turbato Corde. O decreto de Clemente era consistente com a interpretação dos Judeus Talmúdicos como subversivos. Na medida em que os Judeus eram heréticos em sua própria religião e induziram Cristãos insuspeitos a abraçar sua heresia, eles seriam atraídos para a Inquisição, o mecanismo construído para combater heresia. O assunto da conversão também desempenhava um papel. Se os Judeus aceitassem o batismo, era presumido que eles aceitaram-no livremente, e não era permitido ao Judeu decair à vida anterior, como um cachorro retornando ao seu vômito. Se ele recaísse na mesma falta, ele era pra ser tratado como um herético, não um infiel tolerado por causa da ignorância. Porque a teologia do sacramento do batismo alegava que aquele sacramento deixava uma marca indelével na alma, “é necessário que ele seja forçado a sustentar a fé que aceitaram sob coação ou por necessidade, para que o nome do Senhor não caia em má reputação, e a fé que eles aceitaram seja sustentada vil e desprezível.”

Como nós vimos, o Judaísmo, de acordo com a nova percepção Católica, não era uma religião; era uma ideologia revolucionária. Expondo o Talmud, os Judeus privaram-se de qualquer entendimento correto da Bíblia; sua lealdade, de acordo com Martini, repousa na Anticristo. Como resultado, “o redentor a quem eles agora esperam no fim do Império Romano é realmente o Anticristo.”

Em 6 de novembro de 2002, porém, o Cardeal Walter Kasper, presidente da Comissão do Vaticano pelas Relações Religiosas com os Judeus, anunciou na Faculdade de Boston que os Judeus “no intuito de se salvarem” não “devem se tornar Cristãos; se eles seguem sua própria consciência e acreditam nas promessas de Deus como eles compreendem-nas em sua tradição religiosa estão alinhados ao plano de Deus, que para nós vem até sua plenitude histórica em Jesus Cristo”.




A verdadeira Inquisição Espanhola.

Inquisição Espanhola foi catorze vezes menos letal que bicicletas infantis.
"À luz de sua reputação atormentadora, certamente surpreenderá aqueles que acreditam que milhões de pessoas morreram na Inquisição Espanhola aprender que durante os séculos 16 e 17 menos de três pessoas por ano foram sentenciadas à morte pela Inquisição em todo o Império Espanhol, que ia da Espanha à Sicília e Peru [1]. [...] O que significa que através dos seus infames 345 anos [considerando três breves suspensões], a terrível Inquisição Espanhola foi, numa base anual, cerca de catorze vezes menos letal que bicicletas infantis [2]".

Theodore Beale, The Irrational Atheist, pág. 219 (Kindle):
[1] Henry Kamen, The Spanish Inquisition: A Historical Revision. New Haven: Yale University Press, 1997, pág. 203;
[2] Facts About Injuries To Children Riding Bicycles. Safe Kids Worldwide.









quinta-feira, 16 de agosto de 2012

China comunista e sua infame indústria farmacêutica de fetos abortados.

Segundo artigo do jornal americano International Business Times (5/8/2011), um documentário da TV sul coreana, SBS, revelou como funciona o sinistro comércio da indústria farmacêutica, na China comunista, para vender bebês abortados, reduzidos a pó, como anti-histamínicos.

Os açougues de crianças - hospitais e clínicas de aborto - informam, à empresa interessada na compra, quando ocorre um aborto. O feto é guardado pela compradora em um freezer de alguma família para não levantar suspeita. Depois, o próximo passo é triturar os bebês assassinados até transformá-los em pó que é encapsulado e vendido como remédio contra alergias.

Os repórteres da SBS compraram algumas dessas cápsulas para fazer testes de DNA. Os resultados demonstraram que o material genético era 99,7% humano e restos de cabelo e unhas ainda podiam ser encontrados. Inclusive o sexo do bebê podia ser identificado. 

O documentário foi ao ar na TV SBS em 6 de agosto de 2011 e revelou ainda a existência de uma rede de negócios estabelecida entre a China e Coréia do Sul para atender a demanda do produto no mercado farmacêutico sul-coreano.

Além dos tais comprimidos, afirma a reportagem de International Business Times que o aparelho de microondas hospitalar utilizado para transformar o bebê em pó é um outro negócio popular na China.
Diante de tal monstruosidade nos defrontamos com outra: será que esse macabro comércio farmacêutico se limita apenas na produção de anti-histamínicos e, ainda mais, quem pode nos garantir que esse mesmo comércio se circunscreve somente as fronteiras chino-sul coreanas?






Extraído de:http://noticias-lepanto.blogspot.com.br/2011/10/industria-farmaceutica-chinesa-produz.html








quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O Império Asteca que a esquerda não mostra.



Diversos povos coexistiram no imenso território que chamamos de México e concebemos como unidade nacional: no sul, Maias e Zapotecas; no leste, Olmecas, Totonacas e Toltecas; no centro, Tlaxcaltecas, Tarascos, Otomíes e Chichimecas; ao norte, Pimas, Tarahumaras e muitos outros, todos estranhos entre si, quase sempre inimigos. Dentre eles, a distinção coube aos Astecas; vindos do norte, migraram em direção aos grandes lagos mexicanos, na região de Anáhuac. Conduzidos por sua divindade, Huitzilopochtli — Huichilobos para os espanhóis –, um deus guerreiro e terrível, chegaram em 1168 no vale do México (termo que deriva de Mexitli, e que era o outro nome de Huitzilopochtli) e estabeleceram sua capital em Tenochtitlán
Assim, o povo asteca, persuadido de ter sido escolhido pelos deuses para uma missão grandiosa, foi ocupando o lugar dos outros povos e, já em 1400, toda a vizinhança do lago caíra em suas mãos. Em 1500, pouco antes da chegada dos espanhóis, o império asteca reunia 38 domínios e se fundava na tríplice aliança entre México (Tenochtitlán), Tezcoco e Tacuba (Tlacopan).
 
O povo asteca sintetizou o que havia de melhor nas culturas dos demais povos, como os teotihuacanos e os toltecas. Organizado em clãs, sob um imperador poderoso e vários nobres, desenvolveu-se mui prosperamente. Atingiu conhecimentos notáveis em astronomia, elaborou um calendário de grande exatidão e formou um sistema pictográfico e ideográfico de escrita que, com o dos Maias, foi único na América pré-hispânica.
 
Por outra parte, os astecas, conquanto não conhecessem a roda nem tivessem animais de tração, construíram com grande destreza sendas e pontes, casas, aquedutos e grandiosos templos piramidais. Ignoravam a moeda, mas constituíram com muita ordem enormes mercados outianguis. Tampouco conheciam o arado ― furavam o arado com uma espécie de lança ― mas fizeram boas plantações, ainda que pequenas, e conseguiram plantar engenhosamente em chinampas ou ilhas artificiais.
 
Quanto às diversas artes, os povos indígenas do México alcançaram alto grau de perfeição técnica e estética.
 
Assim, em 1519, antes da conquista, os objetos que Hernán Cortés enviou a Carlos I ― uma série de objetos indígenas de ouro, prata, pedras preciosas, plumas etc, que recebera dos maias, totonacas e dos obséquios astecas de Montezuma ― causaram profunda impressão na Europa. Albert Düher, que as pode ver na corte do imperador, em Flandres, escreveu em seu Diário: “Ao longo de minha vida, não vi nada que alegrasse o meu coração tanto quanto estas coisas. Entre elas, encontrei objetos maravilhosamente artísticos... Sinto-me incapaz de expressar meus sentimentos”. (J. L. Martínez, Cortés 187).
 
A grandiosa cidade
 
A capital do império asteca era Tenochtitlán, construída em uma lagoa e consagrada em 1325, com a dedicação de um grandioso templo piramidal ou teocali (de teotl, deus e cali, casa).
 
Quando, em novembro de 1519, os espanhóis avistaram pela primeira vez aquela cidade formidável, uma das maiores do mundo naquela época, ficaram realmente assombrados... “Após termos visto coisas tão admiráveis ― conta o soldado Bernal Díaz del Castillo ― não sabíamos o que dizer, ou se era verdade o que surgia diante de nós; havia grandes construções em terra seca e outras tantas na lagoa... estávamos diante da grande cidade do México; e não chegávamos a quatrocentos soldados” (cp. 88)...
 
Quatro dias mais tarde, já dentro da cidade, Cortés e os seus homens – os que dispunham de cavalo iam montados –, acompanhados de caciques astecas, saíram para visitar aquela formidável cidade. A primeira coisa que visitaram foi o tianguis, o imenso mercado da praça de Tlatelolco: mantas multicolores e jóias preciosas, animais e escravos, alimentos e bebidas, plantas e pássaros, ali havia de tudo, disposto em perfeita ordem.
 
“O rumor e o zumbido do vozerio ― conta Bernal ― podia-se ouvir a uma légua de distância; entre nós havia soldados que estiveram em muitas partes do mundo, em Constantinopla, em toda Itália e Roma, e disseram que jamais avistaram praça tão bem ordenada, tão harmoniosa, tão grande e tão cheia “. E junto a isto, “víamos naquele grande lago uma multidão de canoas, umas vinham para abastecer o comércio, outras voltavam com cargas e mercadorias; ... e naquelas cidades víamos cúes e oratórios à maneira de torres e fortalezas [pirâmides quadrangulares] e todas embranquecendo, o que era de se admirar, e as casas de açotéia.” (cp.92).
 
Outro soldado, Alonso de Aguilar, também ao visitar aquela grande cidade ainda não conquistada, confessa que “assustava ver tanta gente junta” e escreve: “Aquela cidade tinha mais de cem mil casas, e cada casa era firmada e construída na água sobre palafitas, e entre as casas havia uma viga e nada mais, por onde se passava, de modo que cada casa era uma fortaleza.” (Relación, 5a. jornada).
 
Um ano e meio mais tarde, no dia 13 de agosto de 1521, o poder asteca, que tinha seu centro naquela grande cidade de Tenochtitlán, viria abaixo para sempre, cedendo lugar à Nova Espanha.
  
Religiosidade e altitude moral
 
Quando os espanhóis entraram no México, descobriram povos profundamente religiosos, para os quais a religião era propriamente a forma fundamental da existência individual e familiar, social e política. Apesar de politeístas, tinham alguma idéia de um Deus superior, criador de tudo, imortal e invisível, sem princípio nem fim (Hunab Ku, para os Maias, Pije Tao para os zapotecas...). Também tinham alguma noção de uma recompensa final após a morte e praticavam, os maias e astecas em especial, uma ascética religiosa severa, com orações, jejuns e mortificações rigorosas e sangrentas.
 
As orações astecas que nos chegaram são realmente maravilhosas pela profundidade de seu sentimento e pela pureza de sua idéia: “Oh, valoroso senhor nosso, sob cujas asas nos amparamos, nos defendemos e encontramos abrigo! Sois invisível e não palpável, como a noite e o ar! Oh, que eu, pequeno e de pouco valor, atrevo-me a aparecer diante de vossa majestade! ... Pois, o que então, ó senhor nosso, piedoso, invencível, impalpável, a cuja vontade obedecem todas as coisas, de cuja disposições pende o regulamento de todo o orbe, a quem tudo está sujeito, o que haveis determinado em vosso divino peito?” (Sahagún VI, 1)...
 
Com algumas exceções, quase todos esses povos, maias, astecas, totonacas, obcecados pelo mistério do devir e da morte, praticavam sacrifícios humanos de enigmática significação. Em concordância com outros autores, Christian Duverger, ao estudar a economia do sacrifício asteca, vê nele um intento de sustentar e dinamizar os ciclos vitais, já que “a morte libera um excedente de energia vital”... e precisamente no sacrifício ritual, a artificialidade da morte provocada é o que torna possível orientar até ao deus essa energia, conseguindo assim que se “transmute a fuga das forças em um germe de potência” (La flor letal 112s). Deste modo, o sangue humano oferecido aos deuses vitaliza as fontes de toda energia, e alimenta as reservas de força que o sol simboliza, concentra e irradia.
 
A educação asteca era também profundamente religiosa. Junto a certos conhecimento manuais, guerreiros, musicais ou astrológicos, ou de higiene, cortesia e oratória, os rapazes eram iniciados, entre os 10 e 20 anos de idade, na oração, no serviço aos ídolos, na castidade, com práticas penitenciais mui severas. A ascese era tanto mais dura quanto mais elevada a condição social. Na alta sociedade, por exemplo, a embriaguez podia ser castigada com a morte. Já aludimos acima ao quadro verdadeiramente impressionante que traçou Bernardino de Sahagún ao descrever a antiga pedagogia religiosa dos índios da Nova Espanha (Historia Gral. lib. VI).
 
Aos que se destinavam pelo berço a ocupar lugares de autoridade, educava-se particularmente desde pequenos no autodomínio e na mais profunda humildade religiosa: “Veja não seja fingida a tua humildade, pois o senhor nosso deus vê os corações e vê tudo que ali há de secreto, por muito escondido que estejam; veja que seja pura a tua humildade, e sem mescla alguma de soberba” (lib. VI, 20)... Entre os astecas, como observa Jacques Soustelle, “o ideal da classe superior é uma gravitas completamente romana na vida privada, nas palavras, na atitude, aliada a uma rara cortesia” (La vida 222).
 
É interessante observar, por outro lado, que estas grandes culturas, apesar de padecerem desvios muito grandes relativos à vida sexual, souberam a seu modo apreciar a castidade e inculcá-la eficazmente. Neste sentido, a chegada dos espanhóis pôde ocasionar algum relaxamento, ao menos em determinados aspectos. Assim, por exemplo, refere o espanhol Diego de Landa que as mulheres maias de Yucatán “gabavam-se de ser boas mulheres e tinham razão em fazê-lo, porque antes de conhecerem a nossa nação (do que choram agora os velhos), eram formidáveis” (Relación cp.5).
 
As grandes qualidades dos índios
 
As qualidades dos índios mexicanos impressionaram os primeiros espanhóis, talvez mais ainda que seus vícios e horríveis superstições. Um franciscano da primeira evangelização, por exemplo, Motolinía, falou muitas vezes dos índios do México com verdadeiro entusiasmo. Em suaHistoria de los indios de la Nueva España, apesar de referir-se geralmente a índios recém cristianizados ― conclui sua obra em 1541 ― reflete também em boa parte o que aqueles índios já eram antes do Evangelho:
 
“Estes índios não têm quase nenhum obstáculo (dos muitos que nós, espanhóis, temos) que os impeça alcançar o céu. Em suas vidas, contentam-se com muito pouco, e tão pouco que mal têm com que se vestir e alimentar. Sua comida é paupérrima, assim como as suas roupas. Para dormir, a maior parte deles ainda não possui uma esteira em boas condições. Não cuidam de adquirir ou acumular riquezas, nem se matam por estados ou dignidades. Deitam em suas pobres mantas e, tão logo acordam, estão prontos para servir a Deus. E se querem se disciplinar [para fazer penitência] não têm vergonha ou problema em vestir-se e desnudar-se. São pacientes, muito sofridos, mansos como ovelhas. Não me lembro de tê-los visto guardar rancor; humildes, obedecem a todos, já por necessidade, já por vontade: sua vida é servir e trabalhar. Todos sabem erguer uma parede ou construir uma casa, fazer uma corda e todos ofícios que não necessitem muita arte. Nas doenças, se é grande o sofrimento, também o é a paciência. Seus colchões são a terra dura, sem pano algum; quando muito, possuem uma esteira rasgada e, como travesseiro, usam uma pedra ou pedaço de pau; muitos dormem sem travesseiros, com a cabeça na terra. Suas casas são muito pequenas, algumas com um terraço muito baixo, algumas de palha, outras como a cela daquele santo abade Hilário, que mais parecia sepultura que casa".
 
“Em suas casinhas moram pai, filhos e netos; comem e bebem sem grande alvoroço. Passam seu tempo e vivem suas vidas sem controvérsias ou inimizades; saem para buscar o necessário à subsistência da vida, e nada mais. Se a alguém doe a cabeça ou cai enfermo, procuram um médico que se possa encontrar facilmente, em silêncio e sem muito custo; se não há nenhum médico, tem mais paciência que Jó...”
 
“Se alguma destas índias entra em trabalho de parto, é fácil encontrar uma parteira, porque todas são. E se é a primeira vez, procura-se a primeira vizinha ou parente para ajudá-la e, aguardando pacientemente a natureza fazer seu trabalho, parem com menos trabalho e dor que nossas espanholas... A primeira coisa que fazem a seus filhos é lavá-los com água fria, sem medo de que o frio lhes seja daninho. Por aí vemos e conhecemos que muitos destes, criados assim, desnudos, vivem bem e saudáveis, dispostos, robustos, fortes, alegres, ligeiros e habilidosos para o que a vida lhes exigir; e o mais importante é que, tendo chegado ao conhecimento de Deus, têm pouca dificuldade em seguir e guardar a vida e a lei de Jesus Cristo”. E acrescenta: “Quando considero as dificuldades e complicações dos espanhóis, peço a graça de me compadecer deles e, em primeiro lugar, de mim” (I,14, 148-151).
 
O Senhor, “que ensina ao homem a ciência, quis dar a estes índios grande engenho e habilidade naturais para aprender todas as ciências, artes e ofícios que lhes foram ensinados, porque aprenderam todas em tão breve tempo, que mesmo os ofícios que em Castilla gasta-se muitos anos para se aprender, aqui, bastou observá-los e ver como são feitos, para muitos tornarem-se mestres. Possuem o entendimento vivo, recolhido e sossegado, não orgulhoso ou ostentador como em outras nações... Aprenderam a ler em pouco tempo, tanto em espanhol como em latim... em pouco tempo habituaram-se a escrever, e se o professor mudasse a maneira de escrever, logo também mudavam a letra e a tornam similar a de seu professor”. Todas as ciências, artes e ofícios ― a música e o canto, a gramática e a pintura, a joalheria, o bordado ou a construção ― a todas aprenderam e de tal modo que não raro superavam brevemente os seus professores espanhóis. (III,12-13, 398-411).
  
Dominadores de muitos povos
 
O messianismo asteca fundava-se no grêmio sacerdotal e numa formidável casta de guerreiros. Deste modo, o poder do povo asteca foi, pouco a pouco, subjugando muitos povos e domínios. Os embaixadores astecas, com grandiosa pompa e acompanhamento, visitavam estes povos e lhes convidam a tornarem-se súditos. A embaixada de Tenochtitlán era a primeira. Se não fosse o bastante, seguia a de Texcoco e, se tampouco conseguia o objetivo, a embaixada de Tlacopan correspondia ao ultimatum, a última advertência. Uma vez submissa, a cidade ou província, pela razão ou pela força guerreira, procedia-se às cerimoniosas negociações, nas quais se estabeleciam os tributos (Soustelle 203-213). Os povos subjugados conservavam normalmente os seus próprios chefes e leis, seus idiomas, costumes e divindades, apesar de terem também de reconhecer o deus nacional asteca.
 
Por outro lado, como nota Alvear Acevedo, é preciso levar em conta que “a guerra, a conquista e a subjugação de outros povos tinham motivos econômicos e políticos, mas também razões religiosas de busca de prisioneiros para a sua imolação” (87). Em todo caso, nos princípios do século XVI, o imperador Montezuma, o grande tlatoani(de tlatoa, o que fala), recebia tributo de 371 povos. A cada semestre, passavam os arrecadadores, ou calpixques, para recolher os impostos que estavam perfeitamente estipulados em espécies e quantias. Assim era o grande império asteca, e o náhuatl era a sua língua.
 
Esta ambiciosa política guerreira dos astecas trouxe uma paz imperial muito precária entre os povos, pois, como sublinha Motolinía, “todos estavam sempre envolvidos em guerras, uns contra os outros, até a chegada dos espanhóis. Era costume geral em todos os povos e províncias deixar nas fronteiras uma grande porção de campo ermo para as guerras. E se por acaso alguma vez fosse semeado, o que era muito raro, os que o semeavam nunca gozavam da colheita, porque os inimigos o arrasavam e destruíam” (III,18, 450).
  
O lado sinistro de um mundo pagão
 
Segundo narra Bernal Diéz del Castillo, os soldados espanhóis, primeiro em Campeche, em 1517, a oeste de Yucatán, e logo a medida em que avançavam suas incursões, foram conhecendo o terror dos templos dos índios, onde homens eram sacrificados, e o horror dos sacerdotes,papas, “os cabelos muito compridos, revoltos, cheios de sangue, que não se pode esticar nem pentear”... Ali viram “umas casas muito grandes onde adoravam seus ídolos, bem construídas de cal e pedra, e tinham figurado em algumas paredes muitos bustos [imagens] de serpentes e grandes cobras, e outras pinturas de ídolos de rosto mau, ao redor de algo que se parecia a um altar, cheio de gotas de sangue” (cp.3). 
 
Em uma ilhota “encontramos duas casas bem feitas e, em cada casa uma escadaria, por onde se subia a algo que se parecia com altares, e naqueles altares havia uns ídolos de rosto mau que eram seus deuses. E ali encontramos cinco índios que foram sacrificados naquela noite, e tinham os peitos abertos e os braços e músculos cortados e as paredes da casa cheias de sangue” (cp.13). O mesmo foi visto não muito depois na ilha que chamaram San Juan de Ulúa (cp. 14). Eram cenas espantosas, com que por vezes aqueles soldados se deparavam como testemunhas terrificadas.
 
Avançando em direção a Tenochtitlán, a capital asteca, Pedro de Alvarado fez uma expedição de reconhecimento com duzentos homens pela região de Culúa, dominada pelos astecas. E  “chegando aos povoados, viu que todos foram despovoados naquele mesmo dia, e encontrou em uns cúes [templos] homens e rapazes sacrificados, as paredes e altares de seus ídolos ensangüentados, os corações oferecidos aos seus ídolos; nas vítimas viram os golpes da faca de pedernal, com que abriam seus peitos para arrancar o coração. Relata Pedro de Alvarado que a maioria dos corpos estavam sem braços e sem pernas, e que outros índios disseram que os levaram para comer, com o que nossos soldados muito se admiraram, tamanha a crueldade. E não falemos mais de tanto sacrifício, pois daí por diante, em cada povoado, não encontramos outra coisa” (cp.44).      
  
Huitzilopochtli
 
Porém, maior espanto teriam em Tenochtitlán, no coração mesmo do império asteca. Aquele império formidável, construído sobre o messianismo religioso asteca, tinha, como vimos, um inegável centro espiritual: o grande teocali de Tenochtitlán, desde o qual imperava Huitzilopochtli. Este ídolo terrível, que fora a princípio cultuado em uma modesta cabana, posteriormente, em templos maiores, e finalmente entronizado de modo solene no teocali máximo do império em 1487, cinco anos antes do descobrimento da América.
 
Durante quatro anos, milhares de escravos índios o edificaram, enquanto o imperador Ahuitzotl guerreava contra vários povos a fim de fazer prisioneiros para o sacrifício. A pirâmide quadrangular, com uma altura de mais de 70 metros, possuía um terraço onde havia dois templetes, num dos quais sobressaia o terrível Huitzilopochtli, e no outro, Tezcalipoca. Cento e quatorze elevados degraus conduziam ao topo pela fachada principal da pirâmide. Em volta do templo, muitos outros palácios e templos, o jogo de bola e os mercados formavam uma imensa praça. No alto do teocali, em frente ao altar de cada ídolo, havia uma pedra redonda ou téchcatl, preparada para os sacrifícios humanos.
 
À multidão de deuses e templos mexicanos correspondia uma quantidade enorme de sacerdotes. Somente neste templo maior assistiam uns 5.000 e, segundo diz Trueba, “não havia menos de um milhão em todo o império” (Huichilobos 33). Entre estes sacerdotes existiam hierarquias e graus diversos, e todos eles se sujavam diariamente de fuligem, vestiam mantas largas, deixavam os cabelos crescerem indefinidamente, os trançavam e untavam com tinta e sangue. Seu aspecto era tão espantoso como impressionante.
 
Os sacrifícios humanos
 
A vida dos astecas era regida continuamente por um Calendário religioso de 18 meses, composto cada um de 20 dias, e muitas das celebrações litúrgicas incluíam sacrifícios humanos. Outros acontecimentos, como a inauguração de templos, também exigiam santificações com sangue humano. Por exemplo, nos tempos de Axayáctl (1469-1482), quando foi inaugurado o Calendário Asteca, nessa enorme e preciosa pedra de 25 toneladas que é hoje admirada pelos turistas, foram sacrificadas 700 vítimas (Alvear 92). E pouco depois Ahízotl, para inaugurar seu reinado, em 1487, consagrou o grande teocali de Tenochtitlán. Em quatorze templos, durante quatro dias, ante os chefes de Tezcoco e Tlacopan, convidados para a solene cerimônia, foram sacrificados ao demônio inumeráveis prisioneiros, homens, mulheres, crianças, cerca de 20.000, segundo o Códice Telleriano, ainda que provavelmente tenham sido muitos mais, segundo o parecer de outros autores, e como é afirmado na crônica do nobre mestiço Alva Ixtlilxochitl:
 
“Foram oitenta mil e quatrocentos homens deste modo: da nação tzapoteca, 16.000, dos tlapanecas, 24.000, dos huexotzincas e atlixcas, outros 16.000, dos de Tizauhcóac, 24.400, o que completa o referido número; todos esses foram sacrificados ante o estatuário do demônio [Huitzilipochtli], e as cabeças foram encaixadas em uns buracos que propositalmente foram deixados no templo maior, sem [contar] os prisioneiros de outras guerras, menos numerosos, que foram sacrificados depois, ao longo do ano, o que resulta em mais de 100.000 homens; e assim compreende-se os autores que falam em um número maior, pelos que foram sacrificados depois” (cp.60).
 
Trinta anos depois, quando os soldados espanhóis chegaram a ainda não conquistada Tenechtitlan, puderam ver, com espanto inenarrável, como um grupo de companheiros aprisionados em combate eram sacrificados no ritual. Bernal Díaz del Castillo, sem poder reprimir um tremor retrospectivo, faz daqueles sacrifícios humanos uma descrição alucinante (cp. 102). Poucos anos depois, o franciscano Motolinía os descreve assim:
 
“Havia uma pedra larga diante do altar dos ídolos, metade fincada no chão, no alto, acima da escadaria. Nesta pedra punham de costas o infeliz que seria sacrificado, o peito muito tenso porque atavam seus pés e mãos. O principal dos sacerdotes dos ídolos ou seus ministros eram os que mais ordinariamente sacrificavam, mas se algumas vezes havia muitos para sacrificar e esses se cansassem, entravam outros, já treinados no sacrifício, e de pronto, com uma pedra de pedernal, feito uma navalha, ferro de lança ou cruel navalha, e com muita força, abriam o desventurado e arrancavam-lhe o coração, e o celebrante desta maldade apoiava o órgão acima do umbral do altar, da parte de fora, e aí deixava que fizesse uma mancha de sangue; o coração, depois de cair no chão, ainda palpitava um pouco, mas logo colocavam-no em uma tigela [cuauhxicalli] diante do altar.
 
“Outras vezes tomavam o coração e erguiam-no na direção do sol, às vezes untavam os lábios dos ídolos com sangue. Os corações eram não raro comidos pelos ministros velhos; por vezes, enterravam-no e logo erguiam o corpo para jogá-lo escadaria abaixo. E ao chegar embaixo, se era prisioneiro de guerra, o responsável pela prisão junto com amigos e parentes levavam-no e preparavam aquela carne humana com outras comidas, e noutro dia festejavam e comiam-na; se era escravo, não lhe lançavam escadaria abaixo, mas carregavam-no para depois festejarem da mesma maneira.
 
“Nesta cerimônia [Panquetzaliztli] sacrificavam prisioneiros de guerra ou escravos, porque estes eram quase sempre as vítimas usuais. Conforme o povoado, sacrificavam-se uns vinte homens, em outros trinta, ainda em outros, quarenta e até cinqüenta e sessenta; no México não se sacrificava menos de cem homens.
 
“Não se pense que sacrificantes, matando e arrancando corações, ou qualquer outro gênero de morte, faziam-no sempre por vontade própria, e não por força, sentindo muito bem a morte e sua espantosa dor.
 
“Daqueles que assim sacrificavam, tiravam a pele de alguns; em algumas regiões, tiravam a pele de dois ou três; em outras, de quatro ou cinco; no México, de até doze ou quinze; e vestiam aqueles coros, que deixavam abertos nas costas e acima dos ombros e vestiam o mais apertado no corpo que podiam. Depois, como quem veste gibão e calças, dançavam com aquela cruel e espantosa roupa.
 
“No México, guardavam para este dia alguns dos presos de guerra que fossem chefes ou pessoas importantes, e tiravam a sua pele para vestir o grande senhor do México, Montezuma, que, vestido com este couro, dançava com muita gravidade, julgando prestar grande serviço ao demônio [Huitzilopochtli] que honravam naquele dia; e muitos saiam para ver esta cena como algo maravilhoso, porque nos demais povoados os chefes não se vestiam com o couro dos sacrificados, senão demais autoridades. Noutro dia da cerimônia, sacrificava-se em cada parte uma mulher e arrancavam sua pele, e um se vestia com o coro dela e dançava com todos do povoado; aquele vestido com o coro da mulher, os demais, com plumas” (Historia I,6, 85-86).
 
Diego Muñoz Camargo, mestiço, em sua Historia de Tlaxcala escreve: “Disse-me um deles, que havia sido sacerdote do demônio, mas que se converteu depois a Deus e a sua santa fé católica e se fez batizar, que quando arrancava o coração das estranhas e costas do miserável sacrificado, era tamanha a força com que pulsava e palpitava, que chegava a levantar do chão três ou quatros vezes até esfriar” (I,20).
 
Estes sacrifícios humanos eram mais ou menos difundidos pela maior parte dos povos que hoje formam o México. No novo império dos Maias, segundo conta Diego de Landa, sacrificavam-se prisioneiros de guerra, escravos comprados para o sacrifício e até os próprios filhos, em certos casos de calamidades. O sacrifício se realizava normalmente por extração do coração, por decapitação, flechando as vítimas ou afogando-as na água (Relación de las cosas de Yucatán, cp.5; +M. Rivera 172-178).
 
Na religião dos tarascos, quando morria o representante do deus principal, matava-se sete de suas mulheres e quarenta de seus servidores para que o acompanhassem no além (Alvear 54)...
 
As caveiras dos sacrificados eram guardadas de diversos modos. Por exemplo, o capitão Andrés Tapia, companheiro de Cortés, descreve otzompantli (muro de crânios) que viu no grande teocali de Tenochtitlán, e diz que havia nele “muitas cabeças de mortos salpicadas de cal, os dentes para fora”. Descreve também como viram muitas estacas e “em cada estaca, cinco cabeças de mortos espetadas. E quem aqui escreve, junto com Gonzalo de Umbría, contou o número de estacas e, multiplicando pelas cinco cabeça de cada estaca, descobrimos que haviam 136.000 cabeças” (Relación: AV, La conquista 108-109; López de Gómara, Conquista p.350; Alvear 88).
 
“Lágrimas e horror e espanto”
 
Como dissemos, em quase todos os meses do ano, religiosamente ordenados pelo Calendário asteca, realizavam-se no México numerosos sacrifícios humanos. Frei Juan de Zumárraga, arcebispo do México, numa carta de 1531 dirigida ao Capítulo franciscano reunido em Tolouse, disse que os índios “tinham por costume, neste cidade do México, sacrificar a cada ano mais de 20.000 corações humanos aos seus deuses” (Mendieta V,30; Trueba, Cortés 100). Isto explica porque Bernal Díaz de Castillo, ao visitar o grande teocali de Tenochtitlán, apesar de soldado experimentado em muitas guerras, ter se espantado com a quantidade de sangue:
 
“Todas as paredes daquele lugar de adoração estavam banhadas e pretas de crostas de sangue, e assim também o chão, que fedia demais... Nos matadouros de Castilla não há tamanho fedor” (cp.92).
 
Bernardino de Sahagún, franciscano que chegou no México em 1529, onde viveu por sessenta anos, em sua Historia General de las cosas de la Nueva España (livro II), descreve detalhadamente o curso dos diversos cultos rituais que se celebravam em cada um dos 18 meses de 20 dias cada. Por seus relatos, vemos que, ao longo do ano, celebravam-se sacrifícios humanos por uma incessante variedade de motivos, deuses, ritos e vítimas. No primeiro mês, “matavam muitas crianças”; no segundo, “matavam e tiravam a pele de muitos escravos e prisioneiros”; no terceiro, “matavam muitas crianças” e “desnudavam os que vestiam os coros dos mortos arrancados no mês anterior”; no quarto, como vinham fazendo desde o primeiro mês, seguiam matando crianças, “comprando-os de suas mães”, até a vinda das chuvas; no quinto, “matavam um rapaz escolhido”; no sexto, “muitos prisioneiros e outros escravos”...
 
E assim, um mês após o outro. No décimo mês, “jogavam no fogo muitos escravos vivos, de pés e mãos atadas; e antes que acabassem de morrer, os retiravam arrastando-os do fogo, para arrancar seu coração diante da imagem deste deus”... No décimo-sétimo, matavam uma mulher, tiravam o seu coração e decapitavam-na, e o que seguia diante do areito (canto e dança), tomando a cabeça “pelos cabelos com a mão direita, levava-a exposta e dançava com os demais, e levantava e baixava a cabeça da morta no baile”. No décimo-oitavo mês, por fim, “não matavam ninguém, mas se o ano era bissexto, o que ocorre de quatro em quatro anos, matavam prisioneiros e escravos”. Os rituais específicos ― roupas, danças, cerimônias, modos de matar ― eram meticulosamente determinados para cada festa, assim como as divindades que em cada solenidade eram honradas.
 
Frei Bernardino de Sahagún, após escutar diversos informantes índios, registra friamente todos seus relatos ― dentro os quais se advinha por vezes cantilenas, destinadas a memorização, a fim de melhor se recordar os ritos exatos ― e finalmente exclama: “Não creio que haja coração tão duro que, após ouvir crueldade tão desumana, e mais que bestial e endiabrada, como a que fica acima exposta, não se enterneça e se mova a lágrimas e horror e espanto; é certamente lamentável e horrível ver que nossa natureza humana tenha chegado a tanta baixeza e opróbrio, que os pais, por sugestão do demônio, matem e comam seus filhos, sem julgar que haja algo de errado nisso, mas antes, pensem que com isso prestam grande serviço a seus deuses. A culpa desta grande e cruel cegueira, que cai sobre estes desditosos filhos, não se deve imputar tanto à crueldade dos pais, que derramam muitas lágrimas e com grande pesar de seus corações a cumprem, mas ao ódio cruelíssimo de nosso antigo inimigo Satanás, que com astúcia maligníssima os persuadiu a tão infernal façanha. Oh, Senhor Deus, fazei justiça a este cruel inimigo que tanto mal nos faz e nos deseja! Tirai dele, ó Senhor, todo o poder de endurecer os corações!” (lib.II, cp.20).   
 
A poligamia
 
Conta Motolinía que no México “todos tomavam as mulheres que queriam, e havia mesmo quem tivesse até duzentas mulheres. E para isto os senhores e principais roubavam todas as mulheres, de modo que, quando um índio comum queria se casar, bastava encontrar mulher” (I,7, 250).
 
Lópes de Gomara narra do tlatoani Montezuma que em Tepac, o palácio onde normalmente residia, “havia mil mulheres, e alguns afirmam que três mil entre senhoras e criadas e escravas; das senhoras, que eram muitas, Montezuma tomava para si as que lhe agradasse; as demais dava para seus criados e outros cavalheiros e senhores desposarem; assim, dizem, houve um tempo em que cento e cinqüenta engravidaram, porém, persuadidas pelo demônio, abortaram, tomando coisas para expulsar as criaturas, ou talvez porque seus filhos não fossem herdar nada” (Conquista p.344; +Francisco Hernández, Antigüedades I,9)...
   
O enigma dos contrastes inconciliáveis
 
Quem mergulha no mundo do México pré-hispânico não pode senão admirar-se com o que vê de bom, horrorizado com o que vê de mal e, finalmente, perplexo, por não saber como conciliar uma e outra coisa. Como é possível que, no meio de tantas atrocidades, tenha surgido, nos mesmos que as realizavam, elevações espirituais tão consideráveis? (L. Séjourné, Pensamiento 21) É um mistério... O enigma desapareceria se tais elevações fossem apenas aparentes, contudo, é muito difícil duvidar de sua veracidade
 
Certos traços de nobreza espiritual parecem inegáveis e relativamente freqüentes. Recordemos naqueles primitivos povos mexicanos o sentido profundo da transcendência religiosa que impregnava toda a vida, o sentido respeitoso da autoridade familiar e social, a consciência do pecado, as severas práticas penitenciais comuns ao povo ou as excepcionais, realizadas por alguns -- como o chamado jejum teuacanense de alguns jovens: quatro anos de oração, de celibato e abstinência rigorosa (Hernández, AntigüedadesIII,17), as orações belíssimas que freqüentemente elevavam aos seus deuses... Como conciliar tudo isso com tantos outros erros e crimes?
 
A chave do enigma é que os mexicanos professavam com toda sinceridade uma religiosidade falsa. A profundidade da sua religiosidade, frente a um Absoluto de divindades superiores ao humano, explica o muito que neles existia de nobre e admirável: é a presença misericordiosa de Deus, que também se faz onde os homens o buscam e o conhecem (Hch 10,34-35). Por outro lado, a falsidade de sua religiosidade é o que explica o abismo dos horrores diabólicos e das superstições ignominiosas na qual estavam afundados.